Ao pensar em travessia de indocumentados pela fronteira entre o México e os Estados Unidos, a primeira imagem que vem à mente é o deserto de Chihuahua, onde imigrantes arriscam as suas vidas para cruzar as partes áridas e o perigoso Rio Grande em busca de um sonho. Só que os “coiotes” – os traficantes de pessoas que auxiliam nesta jornada ilegal – têm diversificado suas estratégias. E um dos meios mais utilizados atualmente pelos criminosos é transportar dezenas e até centenas de indocumentados de uma vez em caminhões de carga. Nos últimos anos, organizações de apoio a imigrantes acreditam que pelo menos 400 pessoas já morreram dentro destes contêineres, por falta de ventilação ou água e onde a temperatura costuma passar de 45ºC.
O caso mais conhecido aconteceu há cerca de dois anos, quando 56 imigrantes do México, Honduras e Guatemala foram abandonados dentro de um caminhão no Texas. O veículo, naquela ocasião, percorreu cerca de 18 horas até chegar à cidade americana de San Antonio, onde o motorista fugiu com medo da fiscalização. Mas essas situações são mais comuns do que se imagina: com base em depoimentos de instituições federais e dados não oficiais obtidos junto a órgãos de imprensa, o Centro Latino-Americano de Jornalismo Investigativo (CLIP) acredita que mais de 170 caminhões com imigrantes já sofreram acidentes, foram detidos ou abandonados nos últimos cinco anos perto da fronteira sul dos EUA. A estimativa é que quase 19 mil indocumentados tenham viajado nesses contêineres, incluindo mais de 3.200 menores.
“O tráfico humano não é um problema novo. Mas o surpreendente é a sua escalada recente”, disse Tonatiuh Guillén, antigo comissário do Instituto Nacional de Migração (INM), agência mexicana. Ele acrescenta que especialistas têm alertado que os cartéis de drogas assumiram de vez o controle do negócio, que antes era tradicionalmente controlado por grupos de coiotes locais. Ou seja, os criminosos contam agora com dinheiro, tecnologia e pessoal para expansão.
Por outro lado, as autoridades não conseguem fiscalizar a região, até porque não existe uma rota única para atravessar o México clandestinamente em direção à América. Estima-se que cada caminhoneiro receba em torno de US$ 5 mil dólares para fazer a viagem e que, muitas vezes, são obrigados e ameaçados pelos cartéis a cumprir o percurso após serem recrutados aleatoriamente em centros de carga. A recusa pode significar a morte. O assunto voltou à tona com força, até porque a crise na fronteira sul é tema principal da campanha presidencial.
O governo norte-americano tem consciência de que os cartéis da droga assumiram de vez o contrabando de migrantes em ambos os lados da fronteira, incluindo o seu transporte em reboques nas estradas dos Estados Unidos e do México. “Os mesmos grupos que estão encarregados do tráfico de drogas também operam a questão da passagem de pessoas. Eles estão ganhando dinheiro dos dois lados com isso”, admitiu o agente-chefe da Patrulha de Fronteira dos EUA (CBP), Jason Owens, em recente entrevista. Ele acrescentou que a atual administração tem mobilizado recursos para investigar contrabandistas nos seus próprios países, além, é claro, de um maior controle nos pontos de entrada.
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